Um dos pontos de maior dificuldade quando estou trabalhando com ou ensinando Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT) é a própria ideia de aceitação. Tanto as pessoas atendidas quanto alunos interpretam o significado de aceitação como resignação. Considerando que na nossa cultura a ideia de aceitar algo está ligada à submissão, inação e apatia, aprendemos que temos que tentar submeter o mundo à nossa vontade e fazer as coisas do nosso jeito. Há, então, pouco lugar para a ideia de aceitação.
Outra resistência muito comum para a aceitação é a concepção de que funcionamos pela nossa autocobrança. Acreditamos que precisamos condenar o que sentimos e somos para conseguir agir. O medo da aceitação, nesses casos, implica num medo de imobilidade. Mais de uma vez eu ouvi a frase: “se eu parar de me cobrar, não vou fazer mais nada”. Consigo ver que é possível que a autocobrança nos leve à ação. Mas me parece que essa é uma maneira bem miserável de existir. Quando funcionamos nesse modo, estamos sempre na falta, sempre insatisfeitos conosco e, na melhor das hipóteses, o máximo que sentiremos é alívio; dificilmente nos sentiremos plenos, realizados ou em paz. Nossa mente pode sempre criar uma nova falta que teremos que tentar suprir.
Na verdade, o conceito de aceitação na ACT não significa resignação ou inação. Alguns autores da área inclusive argumentam que essa não é uma boa palavra para se usar ao falar sobre essa ideia. Outras expressões seriam mais precisas. Em vez de dizer “aceitar a ansiedade”, poderíamos falar em “parar de brigar com a ansiedade” ou “abrir espaço para a ansiedade”. O que se tenta mostrar aqui é que temos pouco ou nenhum controle sobre nossos eventos internos. Tentar lutar contra eles apenas traz mais sofrimento e atrapalha nossa capacidade de agir. Se estamos tentando eliminar nossa ansiedade para então fazer o que gostaríamos ou poderíamos fazer, é bem possível que fiquemos travados por um bom tempo.
Quando entendemos isso, percebemos que a aceitação, na verdade, destrava a nossa ação. A partir do momento em que sou capaz de abrir espaço para minha ansiedade ou qualquer outro desconforto, sou mais livre para agir. Não preciso mais evitá-la ou fugir dela. Se não houver nenhuma sensação que eu rejeito, posso fazer literalmente qualquer coisa. Pense na pessoa tímida que topa abrir espaço para a vergonha e pode ir a um evento social ou falar em público; a pessoa que aceita as perdas que teve num momento da vida e decide seguir em frente; o alcoolista que aceita que tem um problema com o álcool e busca tratamento.
Ao praticar a aceitação, abrindo espaço para o desconforto, para as duras realidades e para aquilo que somos num determinado momento, podemos mudar. E acredito, pelo que vejo em algumas pessoas com quem trabalho e por experiência pessoal, que um tipo diferente de mudança é possível. Não estamos mais buscando sanar faltas, resolver conflitos internos ou tapar o vazio que sentimos. Entendemos que isso estará lá, sempre. Mas paramos de dedicar a vida a eles. Ficamos bem com o que somos e as mudanças acontecem de uma forma positiva. Em vez de focar na falta, buscamos acréscimo. Nossa motivação passa a ser positiva: vamos na direção daquilo que nos agrada, nos acrescenta, nos diverte. Paramos de brigar com nós mesmos.
É como se saíssemos de uma postura que poderia ser traduzida como:
— Preciso me consertar; devo resolver esse conflito; tenho que controlar essa situação.
Para outra que diz:
— A vida é boa como é; eu estou bem como sou. Posso ir em qualquer direção. Para onde eu quero ir?